AQUELE QUE VEM DO CÉU: comentário de William Barclay de Jo. 3, 31-36

quinta-feira, 5 de maio de 2011

Como já vimos, uma das dificuldades com que nos encontramos no
quarto Evangelho é saber distinguir quando falam os protagonistas e
quando adiciona João seu próprio comentário. Estes versículos podem
ser palavras pronunciadas por João Batista, mas é mais provável que.
trate-se do próprio testemunho e comentário de João, o autor do
Evangelho.
João começa por afirmar a supremacia de Jesus. Se quisermos uma
informação, devemos nos dirigir à pessoa que possui essa informação. Se
queremos receber informação a respeito de uma família, só a obteremos
de primeira mão se a solicitarmos de um membro dessa família. Se
queremos receber informação sobre uma cidade, só a teremos de
primeira mão se dirigirmos a alguém que vem dessa cidade. Do mesmo
modo, então, se queremos receber informação sobre Deus, só a
obteremos do Filho de Deus. E se quisermos informação sobre o céu e a
vida que se leva ali, só a obteremos daquele que vem do céu. Quando
Jesus fala do céu e das coisas celestiais, diz João, não se trata de uma
versão de segunda mão, não é uma informação que provém de uma fonte
secundária, nem de um conto ouvido por aí. Diz-nos o que ele mesmo
viu e ouviu. Para dizê-lo com a maior simplicidade, porque Jesus é o
único que conhece a Deus, é o único que pode nos dizer algo a respeito
dele, e o que nos diz é conforme o evangelho.
A dor de João consiste em que há tão poucos que aceitam a
mensagem que Jesus trouxe; mas quando um homem o aceita dá
testemunho de que crê que a palavra de Deus é verdadeira. No mundo
antigo, se um homem queria dar sua aprovação total de um documento,
tal como um contrato, um testamento ou uma constituição, punha seu
selo no rodapé. O selo era o sinal de que estava de acordo com o
conteúdo e era considerado legal, obrigatório e verdadeiro. Do mesmo
modo, quando alguém aceita a mensagem de Jesus, afirma, testemunha e
concorda que crê que o que Deus diz é verdadeiro.
João continua: podemos crer o que Jesus diz, porque nele Deus
derramou o Espírito em toda sua medida, sem regatear nada. Inclusive os
judeus diziam que os profetas recebiam de Deus uma certa medida do
Espírito. A medida total do Espírito Deus reservava para seu escolhido.
Agora, dentro do pensamento hebraico, o Espírito tinha duas funções a
cumprir: em primeiro lugar, revelava a verdade de Deus aos homens; e,
em segundo lugar, permitia aos homens reconhecer e compreender essa
verdade quando a recebiam. De maneira que dizer que o Espírito estava
em Jesus era a forma mais completa possível de dizer que conhece e
compreende em forma perfeita a verdade de Deus. Para dizê-lo com
outras palavras: ouvir a Jesus é ouvir a própria voz de Deus.
Por último, João volta a pôr os homens frente à opção eterna. Essa
opção é a vida ou a morte. Esta opção se apresentou ao Israel ao longo
de toda a história. Deuteronômio registra as palavras do Moisés: “Vê que
proponho, hoje, a vida e o bem, a morte e o mal ... Os céus e a terra
tomo, hoje, por testemunhas contra ti, que te propus a vida e a morte, a
bênção e a maldição; escolhe, pois, a vida, para que vivas, tu e a tua
descendência” (Deuteronômio 30:15-20). Josué reiterou o desafio:
“Escolhei, hoje, a quem sirvais” (Josué 24:15).
Tem-se dito que toda a vida de um homem se concentra quando
chega a uma encruzilhada. Mais uma vez João volta para seu
pensamento preferido. O que importa é a reação que o homem tenha
frente a Jesus. Se essa reação for o amor e o desejo, esse homem
conhecerá a vida. Se for a indiferença e a hostilidade, esse homem
conhecerá a morte. Deus lhe ofereceu amor; ao rechaçá-lo, ele se
condenou. Não se trata de que Deus tenha feito descer sua ira sobre ele; é
que ele atraiu essa ira sobre si.

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