Sam Harris contra ele mesmo

quinta-feira, 28 de julho de 2011

 
Texto originalmente publicado no excelente site Neo-Ateísmo Português como A Moral Neo-ateísta.
Trata-se de uma análise do debate entre Sam Harris e Lane Craig. Mais uma análise demonstrando como Harris não passa de um intelectual charlatão.
Como eu disse, não que eu ache William Lane Craig a última palavra em apologética, nesse debate específico, ele não ganhou por seus méritos, foi Sam Harris que perdeu por pura incompetência.
***
O representante-ateu dos interesses da humanidade comentou no seu blogue o recente debate entre  William Lane Craig  e Sam Harris. Craig é assim descrito por Ricardo Silvestre:  -Talvez o mais insuportável dos apologistas cristãos nos US
-Tem a mania que ganha os debates todos contra os ateístas.
-A arrogância do “humilde servo de deus”

-Pensa que tem vantagem argumentativa lá porque fala cheio de convicção e de floreados,
-Não vê que não tem “pedalada” para acompanhar os novos ateístas.
-Parece histérico, desnorteado e em desespero de causa.

Um bonito ad hominem. Refutação de um único argumento apresentado por Craig no debate, é que nem vê-la. Não quero ser acusado do mesmo erro, e como considero que foi Harris a perder o debate, explico abaixo porquê. Citações de Harris a negrito. Sugiro a leitura do resumo do debate e a caixa de comentários está aberta para quem quiser apontar algum erro a Lane Craig. Indo ao assunto;
«Uma das razões que as pessoas dão para defender Deus não é a existência de muitas evidências, mas porque acreditam que a crença em Deus é a única fonte para moralidade objetiva.»
  • Deus como fundamento moral objectivo, não dependeria da crença em Deus mas, como é óbvio, da existência de Deus. Se Deus existe, valores morais são objectivos. Se Deus não existe, valores morais não são objectivos. Resumidamente, era este o ponto de Craig. Que neste debate defendeu as duas condições como verdadeiras, e não a existência de Deus.
  • Harris não estava a debater com as genéricas e não citadas “as pessoas”, mas com Lane Craig. Num debate, convém ficarmos focados nos argumentos apresentados pela outra parte, em vez de “as pessoas dizem…”
«Espero que no final dessa hora vocês percebam que a “Crença em Deus” e “Religião” não são necessárias para uma moralidade universal.»
  • Nenhum argumento de Lane Craig defende a “Crença em Deus” ou a “Religião” como necessárias para uma moralidade objectiva. Pelo contrário, o teísmo cristão pressupõe que  há coisas boas e más, independentemente de acreditarmos ou não que o são..
  • Sam Harris optou por discutir como se estabelece uma moralidade universal. Mas o tema do debate não era como tornar o mundo (moralmente) melhor; mas se os valores morais são ou não objectivos. Craig defende que existe mal e bem, independentemente da vontade e gosto de cada um; enquanto. Harris  defende a absoluta bondade da sua utopia de um mundo melhor. Harris falhou o tema do debate, entrando em contradição com a sua definição de moral:
«Mas de onde vêm nossas noções de certo e errado? Claramente foram implantadas em nós pela evolução e moldadas pela cultura. O ciúme sexual, que deu origem ao casamento, parece uma soma desses tipos de fatores. E a Ciência não poderia dizer que é errado trair o parceiro.»
  • Se a as noções de certo e errado são produtos culturais evolutivos, não existe moral objectiva. A referência da evolução, o seu sentido, seria a utilidade com vista à sobrevivência. Como não existe uma receita única de sobrevivência, o que é útil para um indivíduo ou cultura, pode não ser para outros. Logo, quando Harris fala na possibilidade de “moral universal”, está necessariamente a defender a imposição  do seu código moral particular a todos os outros.
  • Tomando como verdadeiro que o casamento é um produto do ciúme sexual, isso não nos diz se a fidelidade conjugal é objectivamente boa e a infidelidade objectivamente má. De um ponto de vista evolutivo, seria prejudicial  ser traído  e favorável a outros trair, e imperou como normal “moral” aquilo que é útil à maioria ou ao mais forte. Então, a definição da moral como produto evolutivo, necessariamente implica uma visão amoral e utilitária das relações sociais.
Por a ciência não nos poder dizer se as coisas são moralmente boas ou más ( é verdade), Harris levanta outro espantalho:
«Aqui é onde as pessoas religiosas começam a ficar preocupados, como acredito que deveriam. E a solução é colocar o deus de Abraão como um árbitro para a verdade moral. É errado trair porque “Javé” disse que sim em um livro sagrado – apesar de ele ser genocida e escravizador em outras partes.»
  • Não existe necessidade de arranjar solução para a incapacidade de respostas morais pela ciência. Seria como querer arranjar solução para o facto das máquinas de lavar roupa não servirem para assar carne. Na verdade, fornos e filosofia  já existem. Ninguém minimamente informado consideraria obstáculo à realização de um churrasco ou de discussão ética; a incapacidade de máquinas de lavar roupa e de ciência para, respectivamente, assarem carne e darem respostas sobre moral.
  • Craig não defendeu no debate, muito menos como solução para o (inexistente) problema que Harris levantou, a obediência a “Javé” “porque disse que sim em livro sagrado“. A discussão sobre a inerrância biblíca não era  tema do debate.
  • Genocídio e escravidão, segundo a moral evolutiva de Harris, não são coisas objectivamente erradas. São actos que beneficiam uns e prejudicam outros
«É divertido ver Dr. Craig me acusar de apenas querer aumentar o bem-estar das criaturas conscientes no planeta. Se esse é um pecado, eu aceito. Imagino só no que Dr. Craig está focado.»
  • É divertido um suposto “filósofo” tornar um debate sobre objectividade moral num concurso de bondade dos intervenientes. O facto é que o ateísmo materialista não tem fundamento para determinar como dever de um indivíduo o aumento do bem-estar das criaturas de um planeta inteiro. E dificilmente Craig teria a arrogância de se auto-promover como capacitado ou conhecedor de um meio para aumentar o bem-estar das criaturas conscientes do planeta. O que ele estava a defender era a existência de valores morais objectivos, não a maneira de tornar o mundo melhor.
  • Na verdade, utopias materialistas de bem-estar planetário, o chamado “ateísmo por um mundo melhor” são, senão pecaminosas, pelo menos perigosíssimas e desfavoráveis a milhões de seres humanos, assassinados e oprimidos ao longo da história por iluminados com a mesma doença de Harris: mentalidade revolucionária.
«Vamos começar com consciência. Imagine um universo constituído de pedras. Claramente, não há bem ou mal, felicidade ou sofrimento – então valores morais não se aplicam.»
  • Se a moral é descoberta, então ela existe independentemente da sua aplicação ou conhecimento por humanos. Mas se a moral é inventada ( por utilidade evolutiva), então ela nunca pode ser objectiva e qualquer intenção de universalizar ao mundo aquilo que é útil para alguns, terá sempre de ser visto como tentativa de impor uma vontade particular ao resto da humanidade.
«E o bem-estar? Talvez isso seja discutível, mas não deveria. Aqui é a única assunção que você tem que fazer: imagine um mundo onde criaturas conscientes vivam em um estado de “maior miséria [em relação ao bem-estar] possível”. E se a palavra “mal” pudesse ser aplicada em algum lugar, com certeza seria esse.»
  • Bem-estar não tem necessariamente a ver com moral. Quando um bombeiro sofre queimaduras ou morre sufocado para salvar outros de um incêndio; o seu acto é heróico e moralmente louvável, apesar dele ter tornado uma criatura consciente, ele próprio, num estado de miséria em relação ao possível bem-estar de viver sem dores. Causar lesões ou morte a outro por legítima defesa, ou para defender mais fracos; encarcerar ladrões e assassinos, etc. Tudo isso é contrário ao bem-estar de alguém, mas não necessariamente “mal”. Provocar sofrimento  a uma criança para a curar de uma doença, médicos fazem-no a toda a hora, também não é sinónimo de mal. Antes pelo contrário. Definitivamente, mal e bem, em termos morais, não dependem necessariamente do bem-estar. Fazer o que é certo, em muitos casos provoca mal-estar.
«A menor base moral possível é evitar o estado de “maior miséria possível para todos”. Se nós temos um dever moral de fazer qualquer coisa, então é esse.»
  • Se, como diz Harris, a moral é um produto evolutivo, não temos qualquer dever moral de fazer tal coisa. Deveres objectivos são incompatíveis com uma moral definida como utilitária. A utilidade não é objectiva e é amoral. Roubar e matar pode ser útil e provocar bem-estar. Isso nada nos diz sobre se é moral ou não. Eu não tenho qualquer dever moral de evitar o estado de maior miséria para todos. Tenho é o dever de agir correctamente, mesmo que isso provoque mal-estar e miséria a alguém.
«1.Questões de bem ou mal dependem de mentes
2.Mentes são fenómenos naturais (i.e., que dependem das leis da natureza)
3.Moralidade pode, logo, ser entendida em termos científicos, porque nós estamos falando de fatos naturais que influenciam o bem-estar de seres com mentes»
  • Se questões de bem e mal dependem das mentes humanas, então as questões de bem e mal não têm respostas universais e objectivas. São determinadas pela matéria.
  • Se as mentes são fenómenos naturais, esta consideração da mente de Harris não é objectiva, mas um fenómeno natural da sua mente. Se as mentes são fenómenos naturais, então a autoconsciência é uma ilusão da matéria. Somos determinados pela matéria.
  • Numa cosmovisão ateísta, dificilmente se pode considerar “fenómeno natural” como  “depender das leis da natureza”. Se a natureza tem leis, quem seria o legislador?
  • A conclusão do raciocínio não segue das premissas. A moralidade só poderia ser entendida em termos científicos, se pudéssemos testar empiricamente o assunto. Mas qual seria o teste científico para descobrir se, por exemplo, torturar uma criança é moralmente bom ou mau? A única coisa possível de fazer cientificamente quanto a esse assunto, seria descrever a dor e as lesões provocadas. Concluir que tal sofrimento é injusto e imoral, já é uma conclusão fora do campo científico.
«Então as coisas podem ser boas ou ruins independentemente da opinião das pessoas. Alguns podem dizer que eu não defini “bem-estar”. Considere uma analogia com “bem-estar físico”. Isso pode parecer difícil de definir. Mas você sabe que é mais saudável que alguém sempre vomitando, gritando de dor e com febre mortal.»
  • Se a moral depende de mentes, será sempre a mente dessas pessoas a determinar a sua opinião moral. Ninguém estará objectivamente certo ou errado.
  • Como expliquei acima, a moral não tem necessariamente que ver com bem-estar. A cobardia para agir correctamente, em muitos casos dá mais saúde e bem-estar do que a coragem para fazer o que é certo.
«Ao falar de moralidade, eu acredito que estamos falando de bem-estar mental. E a verdade é que a ciência está ligada com valores. Uma frase como “A água é composta de H2O” parece neutra sobre valores. Mas se alguém duvida disso, o que podemos fazer? Apelar para os valores científicos. O valor das evidências, o valor do entendimento, o valor da consistência lógica – e se alguém não compartilha desses valores é impossível conversar com essas pessoas.»
  • A hipotética dúvida sobre a composição da água não é um problema moral. Os “valores científicos”, usando a expressão de Harris, são amorais.
  • Sam Harris diz “eu acredito que estamos falando de bem-estar mental“. Mas num debate, não interessa aquilo em que acreditamos. Interessa aquilo que conseguimos demonstrar. Ao falar de moralidade, é notório que Harris acredita em muitas coisas. Faltou justificar com evidências, entendimento e consistência lógica a sua crença de que moralidade significa bem-estar mental. Por exemplo, será  o sentimento de culpa (apreensão de que fizémos algo errado), causando mal-estar mental, um sentimento imoral cuja eliminação é um dever da humanidade? Sam Harris é patético.
«Lembrem-se que Dr. Craig não oferece uma visão diferente de moralidade. O ponto todo no Cristianismo seria garantir o bem-estar eterno das almas humanas.»
  • Craig ofereceu uma visão completamente diferente de moralidade: valores morais objectivos, que não dependem das mentes de humanos.
  • Craig não estava a defender o Cristianismo neste debate.
  • O bem-estar eterno das almas humanas, é uma possibilidade segundo o Cristianismo, mas não o  fundamento ontológico da moral ( o tema do debate)
«Não há evidências do Inferno, mas nós deveríamos pensar no que implica pensar de acordo com esse “framework” moral. Milhares de crianças são mortas antes dos 5 anos em terror e agonia – várias antes de eu terminar essa sentença. De acordo com Dr. Craig, isso tudo faz parte do plano de Deus.»
  • Craig não estava a defender a existência do Inferno neste debate.
  • Craig não estava a tratar do problema do mal neste debate, nem defendeu que o terror e a agonia fazem parte do plano de Deus.
  • Se, como diz Harris, a moral depende das mentes humanas, crianças mortas em terror e agonia não é um mal objectivo. Basta uma mente humana achar que não é. Como a dos tantos psicopatas capazes de provocar esse terror, sem qualquer sentimento de culpa ou remorso.
«Qualquer deus que permite esse tipo de ação é ou impotente ou malevolente. E o pior disso é que, pela visão do Dr. Craig, a maior parte dessas crianças vai para o Inferno por estar rezando para o Deus errado. Há alguma evidência para isso? Não. Apenas é dito na Bíblia. »
  • Esse tipo de acção só é um mal objectivo, se existir um fundamento moral objectivo. O fundamento proposto por Harris, mentes humanas/bem-estar mental, não é.
  • Harris não demonstrou que a ocorrência de mal seria incompatível com a existência de um Deus omnipotente e bom. Permitir algo, não é sinónimo de impotência. Permitir um mal, não é sinónimo de maldade. Por exemplo, é impossível que a permissão de mal e sofrimento possa ser um dever moral?
  • Craig não defendeu que as crianças vão para o Inferno por rezarem para o Deus errado, muito menos por ser “dito na Bíblia”.
«Por outro lado, há vários serial killers na América que podem ser perdoados depois de matarem várias pessoas. E essa visão não tem relação nenhuma com responsabilização moral.»
  • A possibilidade do perdão, no Cristianismo, não implica qualquer desresponsabilização moral. Antes pelo contrário, implica reconhecimento de culpa e penitência. No Cristianismo,  não está em causa se serial killers devem ser perdoados e desresponsabilizados pelo sistema judicial humano.
«Se Deus queria nos guiar, por que ele nos deu um livro? E por que justamente um livro que apoia atos de escravidão, assassinato, etc?» 
  • Craig não defendeu que o fundamento ontológico da moral é um livro.
  • Se, como diz Harris, mal e bem  dependem de mentes humanas; escravidão e assassino serão mal ou bem, dependendo das mentes dos escravos, esclavagistas, homicídas e vítimas de homícidio.
«Dr. Craig apoia a teoria dos comandos divinos morais que afirma que Deus não tem deveres morais, mas que seus comandos refletem sua natureza boa. Foi muito bom que Dr. Craig tenha trazido o assunto da psicopatia ao debate. Essa é uma teoria psicótica porque é ilusória; simplesmente não há razões para acreditar que nós vivemos em Universo governado por um monstro invisível chamado Javé. E também porque ela é totalmente contrária ao bem-estar dos seres humanos.»
  • Ilusão não é sinónimo de psicopatia/psicose. Se não houvesse razões para acreditar em X, acreditar em X seria um erro. Mas estar errado não é necessariamente sinónimo de psicose. Sam Harris insulta gratuitamente, sem sequer demonstrar que a teoria dos comandos divinos seja ilusória.
  • Craig não defendeu a existência de razões para acreditar que vivemos num Universo governado por um monstro invisível chamado Jave. Harris deturpa e ridiculariza a posição do oponente. O que não invalida qualquer argumento. É apenas um desonesto truque emocional.  A teoria dos comandos divinos defendida por Craig, saiu intocável da crítica de Harris
  • Ainda que alguém acredite no “monstro invisível chamado Javé”; Sam Harris não demonstrou que isso seja contrário ao bem-estar desse ser humano. Na sua tese moral evolutiva, qualquer crença terá de ser vista como mecanismo de sobrevivência, útil para a mente que a produziu.
«E eu também não sou a primeira pessoa a notar que há alguma coisa errada com um deus que deseja que você acredite nele a partir de evidências ruins. É verdade que há 2.000 anos havia milagres para nos fazer crer; mas a ciência e suas descobertas das origens humanas tem feito muito mais difícil acreditar em Deus. E não somente o Deus genérico do debate de hoje oferecido por Dr. Craig, mas o Deus Pai e Jesus Cristo que o Dr. Craig suporta.»
  • A existência de Deus não era o tema do debate. Os milagres são irrelevantes para a discussão sobre a objectividade dos valores morais.
  • Não é a primeira que assistimos à idiotice neo-ateísta de transformar injustificadamente uma crença (as evidências para Deus são ruins), num facto absoluto e supostamente assumido pelo oponente. Realmente seria estranho se Deus pretendesse que acreditássemos Nele a partir de evidências ruins. Mas quem defendeu que Deus quer tal coisa?
  • A genética têm contribuído/fortalecida a crença em Deus. Dando dois exemplos: Antony Flew (filósofo ateu que se tornou deísta) e Francis Collins ( director do projecto genoma humano, que se tornou cristão). Ambos escreveram livros sobre Deus, com argumentação científica. Não são casos  únicos.
«O Cristianismo é a cultura do sacrifício humano; essa é a religião que não repudia o sacrifício humano, mas que apoia tanto que celebra um único sacrifício como sendo o efetivo. Se há algum “framework” moral menos valioso do que esse proposto pelo Dr. Craig, eu ainda não ouvi qual.»
  • O que não ouvimos foi um argumento de Harris para justificar o porquê de considerar o sacrifício,  o “framework” moral menos valioso.
  • Os deveres morais são indissociáveis do sacrifício. Uma coisa é a vontade de fazer algo, outra é fazer algo correcto. Qualquer cumprimento de um dever moral pode, em maior ou menor grau, ser um sacrifício. Já dei acima o exemplo do bombeiro. Seguramente não gosta de se queimar.
  • É impossível que o “framework” moral de Sam Harris não  cause também sacrifícios. Afinal, estamos a falar de um tipo que considera ético matar pessoas por causa das suas crenças.
«Talvez vocês tenham notado que Dr. Craig tem um costume charmoso de sumarizar os pontos do oponente de uma forma diferente das que elas foram colocadas. Eu claramente não chamei esses professores de psicopatas, como deixei claro.»
  • Aquilo que o descarado mentiroso deixou claro foi isto: «Dr. Craig apoia a teoria dos comandos divinos (…) Foi muito bom que Dr. Craig tenha trazido o assunto da psicopatia ao debate. Essa é uma teoria psicótica» Pretenderá Sam Harris que os crentes em teorias psicóticas sejam mentalmente saudáveis?
«Toda ciência começa com axiomas assumidos. Uma ciência moral seria da mesma maneira que ciência médica; você só precisa assumir que a maior miséria possível fosse um cenário ruim e digno de ser evitado. Se trazer um valor para a ciência é não-científico, então o que é científico?»
  • O pensamento de Sam Harris não ganha característica axiomática, apenas porque ele PEDE aos outros para o aceitarem como tal.  De “toda a ciência começa com axiomas assumidos“, não segue logicamente que os axiomas científicos sejam arbitrários. Se é dito que X é um axioma científico, isso tem de ser justificado.  Harris não o fez.
  • Nem todos os valores são científicos. Se eu digo que valores morais são científicos, tenho de explicar qual teste empírico permite dar respostas sobre o que é um comportamento certo, errado, mau, bom, justo, injusto, etc. Ainda que seja um dever evitar o cenário de maior miséria possível; essa conclusão não é científica. A ciência médica é moralmente neutra. Um conhecimento médico tanto pode servir para matar como para salvar. A moralidade da medicina reside no pormenor de ser exercida por um ser autoconsciente, livre. Logo, o médico, como qualquer outro ser humano, é moralmente responsável e imputável pelos seus actos.
«Dr. Craig está confuso sobre o que significa objetividade moral para a ciência.»
  • Sam Harris está confuso sobre o que é ciência.  Já fala como se discordar da sua original tese de que a ciência pode dar respostas morais, fosse o mesmo que estar confuso sobre significados científicos, que só existem na cabeça dele.
«Quando falamos de “objetividade” aqui, estamos falando de como estamos pensando: sem parcialidade, de acordo com as evidência, aberta para as opiniões contrárias. Essa é a fundação absoluta para a ciência. E essa também é a diferença fundamental entre ciência e religião.»
  • Craig está aberto às opiniões contrárias. No debate, ele ouviu e respondeu às opiniões de Sam Harris.
  • Quando falamos de objectividade, não falamos apenas do método de pensar. Por exemplo, se os valores morais são objectivos, determinado comportamento será certo ou errado, independentemente de alguém pensar nele como tal.
  • Na questão moral, a religião cristã, é bastante objectiva e realista.  Há mal, bem, justo, injusto, certo, errado, etc, acima da vontade e gosto do ser humano. O ser humano deve procurar e sujeitar a sua vontade à moral ( ao que é correcto), etc..
  • O tema do debate não era se devemos seguir a ciência ou a religião. Ciência e religião não são mutuamente exclusivas; e Craig não precisou de argumentos religiosos para defender o seu ponto neste debate.
  • O tema do debate também não eram diferenças fundamentais entre ciência e religião. Ainda que fosse, pensar sem parcialidade, aberto às evidências e opiniões contrárias, não é uma diferença fundamental entre ciência e religião. Nos dois campos temos exemplos disso tudo. Por exemplo, a Suma Teológica é um extenso tratado de objecções a argumentos e considerações teológicas.
«A dor que você sente é um fato subjetivo sobre você, mas que podemos entender. O que meu argumento quer dizer é que podemos falar objetivamente sobre classes de fatos subjetivos que vão pela “moralidade”. E isso depende do “bem-estar de criaturas conscientes”. Assim, percebemos que uma pessoa que prefere ser neurótica está objetivamente errada, pois está mais perto do pior cenário de miséria possível.
  • De “conheço a tua dor” não segue cientificamente nenhum dever de a evitar ou combater. O conhecimento cientifíco é moralmente neutro.
  • A dor como sentimento subjectivo, não é um facto de “moralidade”.
  • O bem-estar de criaturas conscientes é independente de moralidade. Uma coisa é o conforto, outra é o agir correctamente.
  • Uma pessoa só estaria errada em preferir ser neurótica, se a neurose fosse um comportamento livre e, nesse caso, a neuroso objectivamente violasse um dever ontológico.
«Devo lembrá-los que ateus também podem querer experimentar experiências típicas de pessoas religiosas. Não há nada que impeça um ateu de ficar um ano em uma caverna como um místico verdadeiro faria e meditar em compaixão.»
  • Craig é cristão. Tendo isto em consideração, é fácil compreender que ele dificilmente defenderia o exclusivo ou o mérito religioso da “compaixão” de passar um ano a meditar numa caverna (experiência típica das pessoas religiosas?!!). Sam Harris pode levar o troféu de místico das cavernas para casa. O tema do debate não era esse.
«O que ateus não fazem é só alegações injustificadas sobre a natureza do Cosmos por essas experiências. Eu mesmo medito com génios espirituais e considero Jesus um génio. Mas não precisamos pressupor, sem evidências, algo além disso para provar desse tipo de experiência humana. E o fato de várias religiões possibilitarem o mesmo tipo de experiência demonstra que há um princípio mais fundo por trás disso tudo.»
  • Craig não fez alegações injustificadas sobre a natureza do Cosmas por essas experiências. Não consta que ele medite em cavernas e nenhum argumento seu foi baseado em experiências espirituais.
  • Sam Harris é ateu e medita ( em cavernas?) com “génios espirituais”. Dessas suas experiências fez alegações injustificadas sobre a natureza do Cosmos: a de que há princípio mais fundo por detrás disso tudo. Não justificou qual princípio seria esse.
«Se quisermos entender o mundo além dessas experiências, devemos usar a ciência.»
  • O tema do debate era a moral. Não era a descrição científica para além das experiências místicas e espirituais.
  • Se quisermos compreender o mundo além de experiências espirituais, não  devemos usar apenas a ciência. As fontes e métodos de conhecimento não se limitam a “experiências espirituais” e “ciência”.
«Nós podemos ter uma conversa do século VII usando o Corão; nós podemos ter uma conversa do século I usando o Novo Testamento; ou podemos ter uma conversa do século XXI que nos leva a completa prosperidade do aprendizado humano. Pensem nisso.»
  • Estamos no século XXI, e podemos usar o Corão e o Novo Testamento para conversar. A “completa prosperidade do aprendizado humano“, (só porque estamos no século XXI ?), é manifestação do delírio de Harris. O homem tem a cabeça completamente marada. Poderá estar aí a prova de que meditar em cavernas não faz muito bem aos miolos. O tipo acha-se o iluminado conhecedor do sentido da história, cujo fim parece que é o século XXI e a tal idiotice da “completa prosperidade do aprendizado humano“. Fala como se os séculos tivessem personalidade própria…
«Quantos de vocês são muçulmanos devotados? Há alguma mão levantada? Toda defesa que Dr. Craig disse hoje, com algumas modificações, pode ser dito em defesa do Islão – e, de fato, já foi dito em defesa dele. A lógica é a mesma. Nós temos um livro que diz sobre a natureza da moralidade e como devemos viver.»
  • A lógica de Craig apresentada no debate não foi, em momento algum. a de que temos um livro que nos diz sobre a natureza da moralidade e como devemos viver.
  • Os argumentos de Craig, apresentados no debate não podem ser usados em defesa do Islão. Se os argumentos apresentados por Craig neste debate forem válidos, eles nada nos dizem sobre a veracidade do Islão ou do Cristianismo.
  • Ainda que Craig tivesse usado argumentos que pudessem ser usados por outros em defesa do Islão, isso não demonstraria a invalidade desses argumentos. Podia dar-se o caso de Craig estar certo na utilização desses argumentos para demonstrar o seu ponto, e o Islão errado.
«E se eles estiverem certos? Como devemos ver Deus, ou devo dizer Allah, em termos morais? Nós nascemos na cultura errada. Dr. Craig está condenado; não é preciso dizer. Eu fui confundido pela Ciência. Onde está a compaixão de Allah? Por que Allah não muda essa situação? Pense em quão pouca preocupação você teve pensando nisso.»
  • Se os muçulmanos estiverem certos, certos estarão. Isso não era o tema de debate, e a possibilidade do Islão estar certo sobre questões morais não refuta qualquer argumento que defenda que humanos podem estar objectivamente certos ou errados sobre actos e questões morais.  Craig não defendeu a adesão a nenhum código moral prescritivo ( cristão ou muçulmano) como o  fundamento ontológico dos valores morais  O modo como devemos ver Deus em termos morais, no raciocínio proposto por Craig, é indiferente se Lhe chamamos ou não Allah.
  • Se a religião fosse determinada pela cultura, o ateísmo também seria. A não ser que se considere este ateu acima da restante, e maioria, da humanidade. O que é auto-contraditório: o ateísmo descreve-o como mero animal pertencente à espécie humana.
  • Pense em quão preocupado esteve Harris em fingir que é um representante ou pensador científico. Infelizmente, não demonstrou qualquer prova científica para validar a sua tese moral promovida como tal.
«Escrituras foram escritas por pessoas que tinham menos acesso à ciência e ao senso comum menor do que qualquer pessoa nessa sala. Pense em quanto a mente de Abraão, Moisés… ou mesmo Jesus e Maomé eram fechadas.»
  • O tema do debate não eram escrituras ou textos sagrados.
  • É irrelevante se tais personagens tinham ou não acesso à ciência, pois as suas acções e ensinamentos não se tratam de teses científicas.
  • Qual experiência científica Sam Harris fez para concluir que Abraão, Moisés ou Jesus tinham um senso comum menor do que ele? Não me consta que Abraão, Moisés ou Jesus alguma vez tenham dito que o agir correcto ( a moral), é sinónimo de bem-estar…
  • Primeiro, Harris diz que considera Jesus um génio. Depois, define-o como mente fechada. Logo, para Harris “génio” será sinónimo de “mente fechada”?
«Mas Dr. Craig acredita que os autores da Bíblia sabiam tudo o que precisavam sobre o Cosmos para nos guiar nessa vida.»
  • Craig nunca disse acreditar em tal coisa. Red Herring, Espantalho, Mentira Aditiva, Estupidez Crónica…escolha a etiqueta que preferir para catalogar o discurso de Sam Harris. Qualquer uma delas serve.
«Eu quero sugerir para vocês que essa visão da vida não pode ser possivelmente verdadeira. Assim como não há “física cristã”, não pode haver uma “moral cristã”; qualquer coisa que podemos discutir sobre esses assuntos, espiritualmente e moralmente, pode ser descoberta agora.«
  • Não só Craig não defendeu como possivelmente verdadeira a visão “autores da Bíblia sabiam tudo o que precisavam sobre o Cosmos“; como também não adjectivou a moral de cristã. Ele tratou de valores morais objectivos.
  • Se a moral é descoberta, os valores morais são objectivos. Mas Harris não justificou como pode ser a moral descoberta, quando ainda por cima a define como produto de mentes humanas e evolução.
«Nós devemos descobrir o maior número de factos que permita ao maior número de nós viver uma vida realmente digna de ser vivida.»
  • A “moral” de Harris é numérica. Amoral. Um maior número de pessoas poderia viver uma vida realmente digna de ser vivida, escravizando e oprimindo um menor número.
  • Qual seria o critério objectivo do ateísmo para definir uma vida “digna de ser vivida”?
  • Como se distingue cientificamente uma vivência indigna de uma digna?  Harris é mesmo pateta.
«E isso pode ser construída através de uma civilização global. Esse é o nosso desafio. Sectarismo moral a partir de Deus não é a maneira correta de seguirmos, sem falar no fato que não há evidência, em primeiro lugar, para adotar a visão teísta. Nós só precisamos de honestidade intelectual. Se a fé esteve certa sobre alguma coisa, foi por acidente.»
  • Como dito acima, Harris foi para este debate com a intenção de vender a sua já conhecida banha da cobra globalista. Ele não sabe o que significa ontologia moral.
  • Harris não demonstrou que não há evidência para adoptar a visão teísta. Isso também não era o tema de debate, mas registe-se a afirmação gratuita e injustificada. Teremos de aceitar que não há evidências para adoptar a visão teísta, só porque ele diz que não há?
  • O ateísmo materialista, não tem fundamento moral objectivo para condenar em termos absolutos o “sectarismo moral a partir de Deus”. Segundo o critério de Harris, se isso provocasse bem-estar a um maior número de pessoas ( imagine que um grupo radical islâmico conseguia tornar-se na maioria da população mundial), e sendo um produto evolutivo de mentes humanas; ninguém teria legitimidade para dizer que isso não era maneira correcta de agir. Era uma maneira tão correcta como qualquer outra: proporcionaria bem-estar a alguém.
  • Lane Craig não defendeu a imposição do seu código moral como norma mundial ou qualquer coisa que possa ser considerada “sectarismo moral a partir de Deus”. Discutiu objectividade moral e como o teísmo, ao contrário do ateísmo, seria racionalmente coerente com a existência de valores morais objectivos.
  • O tema do debate não era fé ( confiança pessoal em Deus). Mas numa visão ateísta-materialista, não há certo nem errado. A fé não poderia estar nem certa nem errada, simplesmente seria um produto evolutivo útil para alguém sobreviver. Tal como seria o ateísmo..
  • Se precisamos de honestidade intelectual, por qué no te callas Sam Harris?

    Fonte: Fides et Ratio

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